O advento do Cinema, graças à acção dos irmãos Lumière, despertaram em Aurélio da Paz dos Reis uma grande curiosidade e desejo de dispor equipamento necessário para a rodagem e projecção que tinha em mente. Devido ao seu empenhamento na arte cinematográfica, é considerado por muitos “o pai do Cinema Português”.
Nascido na cidade do Porto, a 28 de Julho de 1862, dedicou a sua vida ao comércio e à floricultura, tendo introduzido no meio a ideia e prática de produção própria de alta qualidade, tendo instalado, até, um posto de venda com a designação: “Flora Portuense”, no qual fornecia o mercado nacional e internacional as mais belas flores do país, assim como as sementes das melhores procedências.
Uma das flores de sua preferência, à qual se dedicou imenso, foi a dália, tendo, inclusive, desenvolvido no jardim do seu palacete, sito na Rua de Nova Sintra, no nº 125, no Porto, uma variante da mesma com a qual acabou por ganhar um prémio por tal proeza.

Porém, a imagem e a sua captação era um hobby a que se dedicava com muito respeito, tendo retratado algumas cenas históricas da vida política portuguesa, nomeadamente os acontecimentos do 31 de Janeiro de 1891, nos quais participou por convicção própria, razão que o conduziu, mais tarde, ao apoio total e incondicional da implantação da República, tendo sido encarcerado duas vezes na Cadeia da Relação pela actividade exercida, local onde se encontra, por ironia, ou talvez não, o seu valioso espólio.
Como tinha carteira profissional de Jornalista, aproveitava as suas deslocações ao estrangeiro, nomeadamente a França e Brasil, para retratar as gentes e os costumes e vendia as mesmas à imprensa portuguesa, nomeadamente à “Ilustração Portugueza” (1903-1923), edição do jornal “O Século”.

Uma das áreas na fotografia a que dedicou imensa energia foi a das imagens estereoscópicas, ou seja, aquelas imagens duplas, uma para cada olho, tendo alcançado excelentes resultados, chamando-se a atenção para o facto de se estar na primeira década do século passado, cujo interesse por este tema era diminuto, aliás como acontece nos dias de hoje tanto com a Fotografia como com o Cinema e a Televisão 3D.
Exerceu cargos públicos diversos, tais como: Vice-Secretário e Vice-Presidente do Senado da Câmara Municipal do Porto, no período que mediou 1914 a 1921, tendo sido, também, Director do Ateneu Comercial do Porto, colaborador do Orfeão Portuense, no Clube dos Fenianos, no Asilo de S. João, tendo sido o Grande criador do Conservatório de Música.
Para além de todas estas actividades, dedicava-se, ainda, ao negócio da venda de automóveis da marca francesa Minerva, de máquinas de escrever Yast e de película da marca Lumière & Jougla.

Atento ao que se passava no mundo, em especial no campo da tecnologia da imagem, ao saber das experiências dos irmãos Lumière, em Paris, partiu com o seu sócio, na área do Cinema, António da Silva Cunha, de imediato para Lyon, ou seja, em 1896, com o objectivo de fazer a aquisição de uma das místicas máquinas de captar e projectar imagens em movimento, tendo realizado e feito apresentações públicas no mesmo ano de vinte e sete filmes, os quais constituem o arranque da cinematografia portuguesa, a par do que se passava lá fora.
Falhada que foi a tentativa de compra aos irmãos Lumière, Aurélio da Paz dos Reis não desistiu dos seus intentos, acabando por fazer negócio, agora em Paris, com os irmãos Werner, adquirindo um equipamento parecido ao cinematógrafo, ou seja, um aparelho cronofotográfico, a que lhe deu o nome de “Kinematógrafo Portuguez”, o qual era mecanicamente diferente daquele, mas que no essencial cumpria a função para que tinha sido concebido, sendo o mesmo usado nos vários filmes então realizados (cerca de 40).

A temática e a forma de realização destes filmes, que não passavam de pequenos documentários, seguiu muito de perto as pisadas dos irmão Lumière, como é o caso do filme “Saída do Pessoal Operário da Fábrica Confiança” (47 segundos) o qual é uma réplica de “La Sortie de l’Usine Lumière à Lyon” (46 segundos), tanto na forma como no conteúdo e até mesmo na duração.
Foi no Teatro Sá da Bandeira, antigo Teatro do Príncipe Real, a 12 de Novembro de 1896, onde pela primeira vez se visionaram filmes feitos em Portugal por portugueses, neste caso Aurélio da Paz dos Reis, tendo-se exibido sete mini-curtas (documentários), todos a rondarem a duração de um minuto cada, aos quais se associaram mais cinco de origem estrangeira.
A próxima experiência deu-se em Braga, respectivamente a 20 e 23 de Novembro, no Teatro São Gerardo, entretanto desaparecido, tendo-se recorrido a outros filmes tanto nacionais como franceses, recorrendo-se, tal como em França, à actuação de um ilusionista.
Entusiasmado com os resultados alcançados, considera ser no Brasil a grande oportunidade de divulgação do seu trabalho cinematográfico, pelo que em Janeiro de 1897 parte para o Rio de Janeiro onde faz sessões de projecção, sendo o programa recheado de documentários sobre vistas portuguesas, assim como temas do dia-a-dia da vida que se vivia em Portugal.
A 15 de Janeiro, no Teatro Lucinda, Aurélio da Paz dos Reis é confrontado durante a sua apresentação com uma série de avarias do equipamento de projecção, resultando as mesmas num profundo fracasso, pelo que cinco dias mais tarde cancela as futuras projecções já programadas e regressa a Portugal profundamente desmotivado, ao ponto de ter abandonado por completo a sua actividade no campo do Cinema.
Para manter viva a presença deste pioneiro do Cinema em Portugal, a Escola Superior Artística do Porto (ESAP) atribuí, desde 2007, através da Direcção da Licenciatura em Cinema e Audiovisual, o Prémio Aurélio da Paz dos Reis destina-se a homenagiar anualmente uma personalidade que, ao longo da sua vida, tenha contribuído para a dignificação e desenvolvimento das Artes Cinematográficas, nas suas diversas manifestações.
Até à presente data (2012), os galardoados foram:
João Botelho (Realizador-2007)
Pedro Costa (Realizador-2008)
João Mário Grilo (Realizador-2009)
Leonor Silveira (Actriz-2010)
José Bogalheiro (Produtor/Professor de Cinema-2011)
Margarida Gil (Realizadora-2012)
Após uma vida preenchida com as mais diversificadas actividades, António da Paz dos Reis veio a faleceu, a 18 de Setembro de 1931, vítima de congestão cerebral.
Filmografia:
“Jogo do Pau”
“Chegada de Um Comboio Americano a Cadouços”
“Saída do Pessoal Operário da Fábrica Confiança”
“O Zé Pereira na Romaria de Santo Tirso”
“O Vira”
“A Feira de S. Bento”
“A Rua do Ouro”
“Marinha no Tejo”
“Manobras de Bombeiros
“Cortejo Eucarístico.......”
“Barcelos”
“Avenida da Liberdade”
“Tripeiros de Ontem”
“Vencidos do 31 de Janeiro”
“Feira do Gado na Corujeira”
“Azenhas do Rio Ave”
“Rio Douro”
“Mercado do Porto”
“O Vira”
“Saída de Dois Vapores”
Torre de Belém”
“Avenida da Liberdade”
“A Dança Serpentina”
“Salva de Artilharia na Serra do Pilar”
“No Jardim”